Chacina do Benedito Bentes. Juiz dá ultimato para Polícia Civil devolver inquérito


Novas investigações concluem por nomes dos verdadeiros matadores e os motivos da barbárie

Corpos das vítimas quando foram encontradas (Alagoas 24 Horas)

Por: Antonio C Melo

Manhã do dia 13 de agosto de 2010. Ricardo da Silva, 24; Bruno Mendes da Silva, 15; Diego Henrique da Silva Galvão, 15 e Lucas Barbosa, 14, saíram de suas casas no Conjunto Cidade Sorriso, região do Benedito Bentes, parte alta de Maceió, dizendo que iam cortar madeira para vender e assim ganhar o dinheiro que serviria para sustentar a família. Este foi o último dia que os quatro foram vistos com vida.

Na manhã seguinte, os jovens foram encontrados próximo ao Loteamento Monte Verde, no mesmo bairro já em vida. Em uma estranha composição, os meninos foram emparelhados um ao lado do outro e assassinados com tiros na cabeça, caracterizando o local como o da execução.

A chacina, na época, chamou atenção por vários aspectos, entre eles o fato dos garotos – a princípio – não terem envolvimento com nenhum negócio ilícito.

As investigações ficaram por conta da delegada da Polícia Civil (PC) Rebeca Cordeiro, que no período era titular da Delegacia de Homicídios (DH). Após várias semanas investigando o caso, que ganhou repercussão nacional, entidades de defesa dos Direitos Humanos começaram a exigir uma explicação por parte do Estado de quem poderia ter praticado o crime e as motivações que culminaram na execução das vítimas.

A Polícia então se apressou e solicitou aos juízes da 17º Vara Criminal que decretasse as prisões dos tidos suspeitos, citados numa relação e encaminhados aos magistrados. Os mandados de prisão foram expedidos no dia 8 de setembro daquele ano, mas a antes pressa da Polícia foi trocada por uma série de fatos estranhos que antecederam o cumprimento dos mandados.

No dia 20 do mesmo mês, o capitão da PM Everaldo Liziário dos Santos, se apresentou à delegada Rebeca Cordeiro e foi ouvido nos termos de declaração. Ele teve o nome citado como um dos suspeitos de ter matado os jovens e a Justiça determinou seu recolhimento. Mas o oficial, antecipadamente, teve conhecimento dos mandados e se antecipou aos fatos.

O suposto vazamento de informações da operação foi investigado através de uma sindicância aberta pela Polícia Militar, atendendo uma solicitação do Ministério Público Estadual (MPE). A sindicância, presidida pelo major da PM Davi José Monteiro, foi publicada no Boletim Geral (BGO) da corporação sob o número 171, de 10 de setembro de 2012.

Já na manhã do dia 23 de setembro, enfim, equipes da PC cumpriram os mandados de busca e apreensão e de prisões contra os supostos envolvidos da chacina.

Naquele dia foram presos o capitão PM Paulo Eugênio Freitas Santos, lotado no 3° Batalhão da Polícia Militar em União dos Palmares; o cabo PM Cícero Nascimento dos Santos; Jaime José de Lima, suposto dono de uma empresa de segurança particular, além de Leonardo Francisco da Silva, 24, o ‘Léo’, e Eliberto Marcelino da Silva, 28, o ‘Beto’.
Contra o capitão PM Eugênio, que ficou preso 45 dias na Academia da PM, não havia mandado de prisão, mas ele terminou sendo detido sob a acusação de ter em sua casa, no Benedito Bentes, munições de fuzil, calibre 7.32, e de pistola 9 milímetros e munições de calibre 380.

Em relação ao cabo PM Nascimento, considerado segurança do capitão Eugênio, pairava a denúncia de que ele estaria envolvido na chacina.

Com Jaime José de Lima, os policiais apreenderam um revólver calibre 38. De acordo com as investigações, a empresa de segurança privada pertencente ao preso, faria a proteção do loteamento Monte Verde, localizado no limite das terras onde os corpos das vítimas foram encontrados.

Na casa de Leonardo, que seria produtor de filmes amadores, foram localizadas apenas armas de brinquedo, mas mesmo assim a Polícia o levou preso sob a alegação que ele teria envolvimento na morte de uma menor cujo características eram parecidas com as da chacina.

Outros detalhes chamaram a atenção nas investigações que foram concluídas e encaminhadas para o MPE, cujo promotor Flávio Gomes, ao detectar as várias discrepâncias do caso, determinou novas investigações, desta vez realizada pela delegada Sheila Carvalho, que havia assumido a Delegacia de Homicídios, concluindo que os dois militares presos nada tinham com as mortes. Ela encaminhou oficio ao Conselho Estadual de Segurança citando que novas investigações apontaram outros suspeitos.

“Comunico que uma das linhas de investigação, com novos investigados, já identificados por esta Delegacia de Homicídios, depende do exame de comparação balística solicitado ao Instituto de criminalística”, relatou a delegada.

E declarou: “Numa investigação não se descarta nenhuma hipótese, mas contra eles (capitão Eugênio e cabo Nascimento), só se surgirem provas contundentes”, disse Sheila Carvalho durante uma de suas entrevistas.

Mais tarde, em um ofício encaminhado ao Conselho Estadual de Segurança Pública (Conseg), a delegada confirmou a inocência do militar. “Diante da ausência de provas científicas e testemunhais, concluímos, salvo melhor juízo, que não há anos autos elementos de convicção contra os investigados, portanto deixamos de indiciá-los” relatou.

Mas se a prisão do oficial, conforme a própria delegada enfatizou, nada teve haver com a chacina, a pergunta é: A quem interessava ou interessa sua ‘desmoralização’ ?

Para isto o EMERGENCIA190 ouviu várias pessoas envolvidas no esclarecimento das mortes e escutou delas uma história intrigante.

Eugênio, o Capitão, por ser amigo de Leonardo Francisco, um dos presos e por manter o projeto social denominado ‘Pró Paz’, no Benedito Bentes, que desempenhava trabalhos comunitários em escolas, creches, promovendo palestras sobre o perigo das drogas, teria irritado grupos com interesses político-partidários, os quais tentaram usar o ‘Pró Paz’ durante uma eleição para prefeito comunitário do bairro.

‘Léo’ teve o nome citado como uma das pessoas envolvidas na morte da menor Manuela Marques da Silva, assassinada a tiros no dia 27 de dezembro de 2009.

Leonardo, que residia no Conjunto Frei Damião, foi morto em fevereiro deste ano, quando estava dentro de um caminhão.

Ferido a vítima perdeu o controle do veículo que terminou colidindo com um ônibus da empresa Cidade Massayó que fazia a linha Benedito Bentes/ Terminal Frei Damião. Os matadores, dois adolescentes, foram presos. LEIA AQUI

Mas foi um bilhete anônimo protocolado junto com um ofício da prefeitura comunitária do Benedito Bentes no Conseg que revelou uma trama habilmente montada, com várias facetas que induziram Polícia e Justiça cometerem terríveis erros.

O bilhete insinuava que o oficial tinha envolvimento com a chacina do Benedito Bentes. Mas essa versão, de acordo com o relator do Conseg, Evilásio Feitosa, não tinha sustentação. Em seu relatório ele chegou a citar fatos que mostrariam o complô.

O líder da prefeitura comunitária, Silvânio Barbosa, através do Ofício nº 157/2010 em 8 de novembro daquele ano pediu a renovação de sua segurança particular, feita na época por policiais militares. A alegação de Silvânio foi que ele vinha sofrendo ameaças de morte feitas pelo capitão Paulo Eugênio e seu irmão, um policial civil, que teve sua identidade preservada.

Em 13 de dezembro, também de 2010, o mesmo líder comunitário renovou o pedido de proteção, daquela vez argumentando que estava sendo ameaçado por traficantes de drogas que agiam no Conjunto Carminha. O relator do Conseg chamou a atenção para o fato que, dessa vez, Silvano não citou o oficial ou seu irmão.

Baseado nas contradições das solicitações, as quais foram atendidas e posteriormente anuladas devido o uso irregular dos policiais por parte do solicitante, costumeiramente visto em bares e locais públicos e particulares se assoberbando pelo fato de ter segurança custeada pelo Estado, o relator chamou Silvano de “useiro e vezeiro”.

“O solicitante é useiro e vezeiro em se envolver em confusões, tal como demonstram alguns processos que tramitam ou tramitaram neste Conselho, alguns, inclusive, de minha autoria. O seu envolvimento com os casos policiais em geral, decorrem da busca de notoriedade com vistas à projeção política. Para o solicitante, em rigor, a segurança individualizada, antes de lhe servir de proteção, é demonstração de prestigio junto à comunidade”, concluiu Evilásio Feitosa.

Em relação à origem do bilhete, anexado como parte do ofício, citando o capitão da Polícia Militar, Silvânio Barbosa responde a um inquérito policial, de nº 022/2012, na Delegacia do 8º DP, sob a acusação de denunciação caluniosa.

Por conta das evidências, o MPE deve solicitar que o líder comunitário seja ouvido pela delegada Fabiana Leão, do 8º DP e que o bilhete seja submetido a um exame grafotécnico – para atestar sua autenticidade – por peritos do Instituto de Criminalística (IC).

Silvânio Barbosa também responde o inquérito nº 0036809-72.2011.8.02.0001, na 6º Vara Cível de Maceió, por indenização a dano moral ao capitão Eugênio.

Em relação à chacina do Benedito Bentes, onde ficou comprovado que nenhum dos presos teve participação, a Direção Geral da Polícia Civil determinou que delegados da DH realizem uma nova investigação (Inquérito Nº 0001801-34.2011.8.02.0001) para apurar fatos recentes que indicam quem matou e os motivos dos crimes. Mas a demora das oitivas levou o juiz substituto da 8º Vara Criminal, Sandro Augusto dos Santos dá um prazo de 48 para a PC devolver todo o inquérito sob pena de determinar busca e apreensão.

O EMERGENCIA190 tentou contato com o líder comunitário, mas ele não atendeu as ligações. Na Delegacia de Homicídios, o delegado Cícero Lima, responsável pela DH, não foi localizado para comentar como andam as investigações e o porquê do inquérito ainda não ter sido enviado a Justiça. Já o capitão Paulo Eugênio, através de seu advogado informou que apesar de não existir na Polícia ou Justiça nenhuma acusação que enlameie sua conduta de pai de família ou agente público cumpridor da Segurança Pública prefere não se ater em relação a nenhum dos fatos que envolvam seu nome.

EMERGÊNCIA190

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